Ressuscitada por Bolsonaro, rodovia ameaça região de maior biodiversidade do Brasil

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Fabiano Maisonnave e Lalo de Almeida

25 de abril de 2021

Folha de São Paulo

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Dois projetos de lei preveem a construção de rodovia que dividiria em dois o Parque Nacional da Serra do Divisor (AC) e a privatização de seu território, abrindo caminho ao desmate, ao gado e à extração mineral

 

PARQUE NACIONAL DA SERRA DO DIVISOR (AC)

Em todo o mundo, o pássaro choca-do-acre só foi encontrado em um único cume dentro do Parque Nacional (Parna) da Serra do Divisor. O habitat do animal arisco e de plumagem escura se limita a um bosque de vegetação baixa, um dos dez tipos de floresta encontrados nessa unidade de conservação, localizada na fronteira do Brasil com o Peru.

Habitat de outros animais endêmicos e de ao menos 1.163 espécies de plantas, a Serra do Divisor é uma das regiões de maior biodiversidade do mundo. Apesar disso, dois projetos em paralelo preveem a construção de uma rodovia dividindo o parque em dois e a privatização do território do Parna, abrindo caminho ao desmatamento, ao gado e à extração mineral.

As propostas são impulsionadas por dois parlamentares bolsonaristas do estado do Acre. A ideia da estrada foi encampada pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido), que já tomou os primeiros passos para a construção do lado brasileiro da rodovia, mas ainda não se pronunciou sobre o projeto de lei em tramitação no Congresso que revoga o Parna da Serra do Divisor.

O prolongamento da BR-364, que hoje termina em Mâncio Lima (670 km de Rio Branco) começou a ser discutido na década de 1970, durante a ditadura militar e está previsto no decreto de criação do Parna, em 1989, durante o governo José Sarney (PMDB). Mas o projeto parecia esquecido com a inauguração, em 2010, da Rodovia Interoceânica (Estrada do Pacífico), que já liga o Acre e o Brasil à costa peruana.

Então começou o governo Bolsonaro. Em 2020, três ministros de Bolsonaro já estiveram no Acre para tratar do assunto. Em junho, Ricardo Salles (Ambiente) visitou a área onde a obra teria início. Em setembro, o então chanceler Ernesto Araújo e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) passaram por Cruzeiro do Sul, a maior cidade da região do Vale do Juruá, por onde a via cruzaria. Reuniram-se com políticos locais e peruanos.

Também em setembro, o próprio presidente defendeu o projeto em uma live no Facebook, argumentando que abrirá uma passagem do Brasil para Pacífico —ecoando o discurso do então presidente Lula (PT) nos anos 2000, quando viabilizou a primeira rodovia, em parceria com o colega peruano Alejandro Toledo, hoje foragido da Justiça.

O DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte) afirma que lançará até junho o Termo de Referência para a contratação do projeto, orçado em pelo menos R$ 500 milhões, segundo estimativa oficial.

A autarquia informou que ainda não foi definido o traçado detalhado da rodovia federal, mas que o lado brasileiro terá cerca de 120 km, dos quais 20 km (17%) dentro do parque da Serra do Divisor e que, para este ano, “estão previstos recursos suficientes para o desenvolvimento das ações de estudos e projetos do empreendimento”.

Na região, o projeto divide opiniões.

Lideranças indígenas e ribeirinhos afirmam que até agora não foram consultados sobre a rodovia —como determina a legislação— e preveem impactos socioambientais negativos. “Até hoje, a primeira pessoa que chegou perguntando pra mim falar sobre a estrada é o senhor”, disse à Folha o cacique Joel Puyanawa, em conversa no centro cultural do seu povo.

Separada do casco urbano de Mâncio Lima (AC) por uma estrada de terra de 10 km, a Terra Indígena Poyanawa, com cerca de 680 moradores, fica na área de influência direta da rodovia. Salles esteve ali em 27 de junho, mas Joel não se reuniu com ele. Diante de lideranças indígenas, o ministro discursou que “o tempo é de integração”, ao defender o projeto rodoviário.

“O entorno da nossa terra já está todo comprometido. Já sabemos o prejuízo que as invasões causam. Os brancos vivem caçando na nossa terra, e as instituições ambientais não têm uma política para impedir. Imagina uma rodovia. Quantos milhões de pessoas vão transitar? Vai aumentar o agronegócio? Vai. Mas a nossa sobrevivência não está no agronegócio”, diz o cacique, vereador pelo PT.

Puyanawa teme também que a rodovia passe por cima de uma área sagrada fora da terra indígena demarcada. Foi nessa região que, por volta de 1910, seu povo foi capturado para ser escravizado pelo coronel seringalista Mâncio Lima (1875-1950). Apesar disso, é retratado como herói pela história oficial, a ponto de ser homenageado com o nome da cidade.

“Essa rodovia ameaça 100% a nossa terra, destrói o nosso sítio sagrado. Basta o prejuízo que tivemos com o coronel. Se a rodovia sair, extermina a história do nosso povo”, afirma.

Por outro lado, prefeitos e empresários apostam na estrada para acabar com o isolamento geográfico da região mais ocidental do país. Apesar de ser do mesmo Partido dos Trabalhadores, o prefeito reeleito de Mâncio Lima, Issac Lima (não é parente do coronel), é um entusiasta da estrada —a ponto de ter aberto, por conta própria, uma picada de 40 km no provável traçado da rodovia.

Para o petista e pecuarista, a conexão com Pucallpa, a 740 km de estrada de Lima, traria benefícios para a cidade de 19 mil habitantes, que vive principalmente da pecuária e da agricultura familiar. “A estrada ligaria o mundo todo e traria pra nossa região aqui, com certeza, o desenvolvimento, o crescimento, e Mâncio Lima seria a porta de entrada.”

O principal responsável pela retomada da ideia é o senador Márcio Bittar (MDB-AC). Aliado incondicional de Bolsonaro, como ele mesmo se define, ele ocupa o estratégico cargo de relator do Orçamento de 2021, o que lhe dá o poder de direcionar verbas para a estrada, entre outras atribuições.

Em paralelo, a deputada federal bolsonarista Mara Rocha (PSDB-AC) apresentou, em novembro de 2019 o projeto de lei (PL) 6.024, que transforma o Parque Nacional em APA (Área de Proteção Ambiental), o nível de proteção mais baixo entre áreas protegidas. A mudança abriria caminho para a privatização das terras, desmatamento, extração de madeira, fazendas de gado, mineração e a exploração de gás de xisto.

Mais reticente, o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), não esteve presente em nenhuma das visitas ministeriais para tratar da estrada. Por telefone, ele disse à Folha que o projeto é de “médio a longo prazo” e que o estado tem outras prioridades, como incrementar o uso da primeira rodovia interoceânica, hoje subutilizada.

Cameli diz que é contra o rebaixamento do parque para APA e que sua principal preocupação sobre a estrada é com o possível aumento de contrabando de cocaína peruana na região de Cruzeiro do Sul, a principal rota de entrada ao Acre. “[As quadrilhas] estão dominando. As fronteiras precisam da maior presença do Estado de Direito.”

Em reação à forma como a rodovia está sendo planejada pelo governo federal e pelos parlamentares, o Ministério Público Federal (MPF) instaurou um inquérito para investigar irregularidades na condução do projeto.

Segundo o procurador da República Lucas Costa Almeida Dias, o objetivo é assegurar que as “comunidades indígenas sejam consultadas de forma prévia, livre e informada”, conforme a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.

O procurador Dias defendeu que o trajeto da estrada considere a possível presença de indígenas isolados e que o licenciamento seja feito pelo Ibama, com a participação da Funai, e não pelo órgão ambiental estadual, mais suscetível a pressões políticas.

RIBEIRINHOS E INDÍGENAS

Folha visitou a região norte da Parna da Serra do Divisor entre o final de outubro e início de novembro de 2020. Foram 9 horas de barco pelo rio Moa desde Mâncio Lima até a comunidade Pé da Serra, o povoamento mais ocidental do Brasil.

Com três pousadas mantidas por moradores, é a base para turistas em busca das cachoeiras, das vistas panorâmicas e das trilhas pela mata. Um dos locais mais belos e impressionantes é o cânion do rio Moa. São 40 minutos de barco entre montanhas verdes, um cenário associado à Amazônia peruana, próxima dos Andes, mas incomum no Brasil

Apesar de ser vetado pela legislação, cerca de 350 famílias de ribeirinhos vivem dentro do parque, ao longo dos rios Moa e Juruá-Mirim. A maioria delas já morava quando o parque foi criado, mas, passadas três décadas, o o governo federal nunca concluiu o reassentamento dessas famílias. Em Pé da Serra, elas vivem do turismo, da agricultura não mecanizada, da caça e da pesca.

A eletricidade vem de geradores e de placas solares. As casas, distribuídas ao longo das margens, chegam até perto das primeiras montanhas, que amanhecem cobertas de névoa. O transporte é feito em canoas com rabetas, motores de pequena potência pilotados por adultos e crianças. Sem internet, um único telefone público faz a comunicação com o mundo.

Nascida e criada à beira do rio Moa, a agricultora Eva Maria Lima da Silva, 41, diz que é contrária tanto à extinção do parque quanto à abertura da estrada. Cozinheira da pioneira Pousada do Miro, ela diz que o parque impediu o avanço do gado e que o turismo é a melhor alternativa econômica.

“Se a estrada sair, vai prejudicar o nosso parque. Seria bom pela rapidez, mas, viajando pelo rio, a nossa estrada, quantas belezas não vou vendo? Quantas matas não estão preservadas?”, afirmou.

Outro morador antigo, o agricultor e artesão João Silva, 51, afirma que a estrada seria benéfica para diminuir o isolamento da comunidade: “De repente, a gente precisar ir pra rua, pegava a estrada, é mais rápido”.

Por outro lado, discorda da proposta de extinguir o parque, projeto que os moradores desconheciam até serem questionados pela reportagem.“Num sentido, achava bom porque o cara podia achar um emprego. Mas deixar sem explorar seria melhor. Ficamos tranquilos, ninguém vai mexer conosco. Se vier esse pessoal, vai tirar muita gente daqui. Os fazendeiros vão entrar, comprar, os caras vão ter de sair.”

Vizinhos ao parque e habitantes históricos do rio Moa e da Serra do Divisor, os indígenas nukinis rechaçam tanto o plano da estrada quanto a transformação do projeto em APA, segundo o cacique Paulo Nukini, 39. Ele não foi consultado sobre o projeto. Seu povo reivindica que parte do parque seja anexado ao território indígena, homologado em 1991.

“Somos contra porque sabemos que vai trazer muito impacto, muito desmatamento. Pode crescer acesso maior dos contrabandos [tráfico de cocaína]. E vai deixar a nossa serra com bastante risco de contaminação. Pra nós, nukinis, a serra é um recanto sagrado”, afirma a liderança, em conversa diante da sua aldeia, à beira do rio. “O Brasil viveu até hoje sem precisar dessa travessia aí.”

A preocupação com o tráfico tem fundamento. O lado peruano da fronteira tem sofrido com o aumento de plantio ilegal de coca e de presença de quadrilhas de narcotraficantes. A droga atravessa o Brasil por meio de rios e picadas na selva.

PARAÍSO DOS PESQUISADORES

A alta biodiversidade e endemismo da Serra do Divisor decorrem principalmente da altitude variada, entre 200 e 650 metros. Além disso, possui os três tipos de rio existentes na Amazônia: água branca (barrenta), água preta (cor de chá preto) e água clara (transparente). Finalmente, é a única área de proteção integral do Brasil que contém uma ramificação da cordilheira dos Andes, incluindo parte de sua flora e fauna.

“Desde 1901, houve cerca de 3.500 coletas botânicas na Serra do Divisor, com o registro de 1.163 espécies”, diz o biólogo da Universidade Federal do Acre (Ufac) Marcos Silveira, que pesquisa no local há 24 anos. “O número de espécies de plantas vasculares [com vaso de condução de seiva] representa 8,3% da diversidade conhecida na Amazônia.”

O catálogo não para de crescer. Junto com outros pesquisadores, o biólogo prepara um artigo no qual mostra que a lista de espécies registradas no parque aumentou 63% desde 1997, quando havia 720 plantas identificadas. Em média, são três espécies encontradas na Serra do Divisor a cada dois meses, entre novas para a unidade de conservação, desconhecidas no Acre e até mesmo inéditas para a ciência.

A fauna não fica atrás. “Quando fazemos inventários, sempre temos uma chance grande de coletar espécies novas. É impressionante”, afirma o biólogo Elder Morato, da Ufac.

Duas espécies de abelha descobertas no Divisor foram nomeadas em sua homenagem: Euglossa moratoi, uma das cerca de 30 espécies de abelha das orquídeas encontradas no parque, e a Dolichotrigona moratoi, uma das aproximadamente 60 abelhas nativas sem ferrão e melíferas.

Outra abelha sem ferrão descoberta no parque é a Celetrigona euclydiana, uma homenagem ao escritor Euclides da Cunha, que, no início do século 20, esteve no Acre para chefiar os trabalhos de delimitação da fronteira do Brasil com o Peru.

“Para nós, biólogos, a Serra do Divisor é bastante emblemática. Não é exagero dizer que todos sonham em algum dia visitá-la”, afirma um comentário assinado pelos pesquisadores Leandro Moraes (Universidade de São Paulo), Tomaz Melo (Universidade Federal do Amazonas e Raíssa Rainha. Todos são também ligados ao Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), com sede em Manaus.

Em novembro de 2019, os três participaram de uma expedição de pesquisa para um censo de vertebrados para marcar o aniversário de 30 anos do parque. Eles encontraram cerca de 80 espécies de anfíbios e 40 espécies de lagartos e cobras.

Também foram identificadas 326 espécies de aves, dos quais ao menos 5 novos registros para o parque, que já ultrapassa 500 espécies listadas de pássaros. Um deles se tornou o símbolo da região: o choca-do-acre (Thamnophilus divisorius). Morador das áreas mais altas, só existe ali em todo o planeta.

“Essa diversidade expressiva só é documentada em outras regiões da Amazônia após décadas de levantamento no mesmo local. Na Serra do Divisor, registramos em menos de 15 dias de amostragem. Muitas dessas espécies são bastante restritas a essa região e já deixam de ocorrer no sentido leste do Acre”, afirmam os pesquisadores.

Tanta diversidade levou o Ministério do Meio Ambiente a protocolar a candidatura, em 2017, do Parque Nacional da Serra do Divisor como Sítio do Patrimônio Natural da Humanidade junto à Unesco (ONU). Essa distinção só foi concedida a apenas duas outras regiões da Amazônia: o Parque Nacional Manú, no Peru, e a Amazônia Central, um conjunto de quatro unidades de conservação no estado do Amazonas (Jaú, Anavilhanas, Mamirauá e Amanã).

A proposta, no entanto, acabou retirada dias depois por pressão do Conselho de Defesa Nacional, órgão ligado ao Palácio do Planalto —na época, ocupado por Michel Temer (MDB). A alegação foi ameaça à segurança nacional.

PEDREIRA NO PARQUE

No PL, a deputada Mara Rocha —irmã do vice-governador, o major da PM Wherles da Rocha— usou 213 palavras para justificar o fim do parque nacional. Nenhum estudo ambiental ou econômico é citado para justificar o fim da única unidade de conservação brasileira de proteção integral situada dentro de uma área pré-andina, onde há uma transição entre a fauna e flora andina e da Amazônia baixa.

Para a deputada, a existência do parque de 837 mil hectares (o nono maior do país) “vai de encontro aos interesses e necessidades do povo acreano” por se tratar da “única região do estado que possui rochas que podem ser extraídas e utilizadas na construção civil, de maneira a fomentar o desenvolvimento econômico do estado”.

Em vídeo divulgado em janeiro de 2019, ela afirma que o objetivo é que o parque passe a permitir ocupação humana e que o “projeto é de autoria do senador Márcio Bittar”.

Por telefone, Bittar tentou se desvencilhar da iniciativa da aliada. Disse que não é “idiota” de apresentar o PL para extinguir o parque, mas defendeu o seu teor. “A Alemanha, que banca ONG ligada à mídia nacional, fez uma Itaipu e meia em termelétrica, cavando buraco na terra por carvão. Agora, nós, no Acre pobre, miseráveis, na Amazônia miserável, não temos pedra.”

“Se dentro da reserva tiver uma jazida de pedra e não dá um quilômetro quadrado, não pode tirar porque a lei diz que não pode tirar. Se tiver petróleo lá dentro, pode tirar? Não pode. E vai continuar assim porque não sou idiota e sei que, se eu apresentar um projeto de lei desses, não passa”, completou.

A reportagem tentou falar com Mara Rocha, mas a deputada federal não respondeu ao pedido de entrevista.

PRIMEIRA INTEROCEÂNICA

O fato é que, desde 2010, o Acre já tem uma ligação ao Pacífico peruano, via Assis Brasil (AC). Porém a obra, quase toda executada no país vizinho, não cumpriu a promessa de transformar o estado amazônico em polo exportador ou corredor para a Ásia. No Peru, a rodovia desatou a explosão do desmatamento e da madeira ilegal e está no centro da “Lava Jato peruana”, escândalo de corrupção que abalou a política do país vizinho.

No ano em que a obra foi inaugurada, as exportações do Acre representavam 0,4% do PIB estadual. Em 2018, último dado disponível, esse percentual subiu apenas para 0,7%. Os dados são do Ministério da Economia e do IBGE.

Esse aumento da participação das exportações no PIB acreano ocorreu em ritmo menor em comparação com a região Norte. Em 2010, as vendas ao exterior dos sete estados somavam 14%. Oito anos mais tarde, esse percentual havia subido para 17,4%.

O Acre é o estado menos exportador do Norte. Em 2019, as vendas aos exterior somaram US$ 31,5 milhões —somente 0,2% das exportações da região.

“A estrada não mudou a realidade econômica do Acre, exceto para passear de automóvel até Lima, Cuzco”, diz o presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), o empresário acreano George Pinheiro.

“A expectativa era de que grande parte das empresas transportadoras faria uma via mais barata e ir pra China, pro Japão. Nada disso aconteceu”, afirma Pinheiro.

Questionado sobre o baixo impacto econômico da estrada que já funciona há dez anos, o senador Bittar disse que a rodovia é “inviável” pelo excesso de curvas e pela altitude elevada do percurso pelos Andes.

“A estrada que sai por Assis Brasil (AC) tem um problema grave, sai na cordilheira alta e pega quase 5.000 metros de altura, não tem carreta que ande ali, tem tanta curva que é inviável”, afirmou. “A saída econômica mais importante é pelo Juruá porque a cordilheira alcança 2.000 metros de altura.”

Esse argumento, usado também por Bolsonaro em setembro, está errado. Entre Pucallpa e Lima, onde está o principal porto do país (Callao), a estrada passa por Cerro de Pasco, uma das cidades mais altas do mundo, a 4.338 metros de altitude.

Bittar admitiu que não há nenhum estudo oficial de impacto econômico da estrada concluído, mas que ele propôs a criação de um comitê binacional para “levantar todo o portfólio de ambos os lados: o que eles têm que nos interessam, e o que nós temos que os interessam”.

Apesar de defender a nova estrada, Pinheiro afirma que a conexão entre Cruzeiro do Sul e Pucallpa, cidade com cerca de 380 mil habitantes, é uma necessidade sobretudo local. “Em termos de distâncias amazônicas, é muito pequena [210 km em linha reta]. E seria uma ligação com uma cidade peruana com grande movimento comercial, industrial.”

Para o líder empresarial, a retomada do projeto se deve sobretudo à “nova perspectiva política”: “Há novos atores que querem fazer a estrada. Todo mundo quer ter o carimbo: ‘Fui eu que fiz a estrada’. Isso dá sustentação política, o que acho isso lícito, normal.”

A viagem dos repórteres Fabiano Maisonnave e Lalo de Almeida foi patrocinada por InquireFirst e pelo Departamento de Educação Científica do Instituto Médico Howard Hughes (HHMI).

 

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