Em 14 dias do mês, Amazônia já tem mais queimadas que em todo setembro do ano passado

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Phillippe Watanabe

Folha de S. Paulo

15 de setembro de 2020

Amazônia brasileira

Os primeiros 14 dias de setembro deste ano já tiveram mais queimadas na Amazônia do que em todo o mês de setembro de 2019.

Até terça-feira (15), 20.485 focos de calor foram registrados no bioma pelo programa Queimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Em todo o mês de setembro do ano passado foram 19.925 focos.

Em três dias do mês, foram registrados mais de 2.000 focos de calor em cada um deles e setembro está com uma média de 1.400 queimadas por dia.

O mês, junto a agosto, é um dos mais críticos em questão de queimadas no bioma, historicamente, por se tratar do período seco na Amazônia. Desmatadores aproveitam esse momento menos úmido para queimar o material biológico que foi derrubado anteriormente.

O número de queimadas das duas primeiras semanas de setembro também já supera o total registrado de queimadas de setembros de diversos anos anteriores, como 2016, 2013, 2011 e períodos mais distantes, como 1998 e 1999.

A elevada quantidade de queimadas no Amazônia chama a atenção também pela prática estar proibida no bioma. Em 16 de julho, o governo publicou, no Diário Oficial, a proibição, por 120 dias, do uso de fogo na Amazônia e no Pantanal.

Em momento próximo à publicação da proibição, porém, o próprio presidente Jair Bolsonaro (sem partido), ironizou um possível efeito de redução de queimadas que a medida poderia provocar.

Além da proibição, o Exército, através da Operação Verde Brasil 2, ainda se encontra em ação na floresta. O uso das Forças Armadas para conter desmatamento e crimes ambientais, porém, não apresenta resultados, considerando que tanto o desmate quanto as queimadas permanecem em níveis altos em comparação à série histórica.

Houve um aumento de 34% no desmatamento da Amazônia, ao consideramos os dados coletados de agosto de 2019 a julho de 2020 (espaço de tempo considerado pelo Inpe como ano referência) e os compararmos ao mesmo período anterior. Os dados são referentes ao Deter, programa do Inpe que detecta desmatamento em tempo quase real e dá subsídios para ações de fiscalização. Os dados do programa, contudo, também podem ser usados para indicar tendências de aumento ou diminuição de destruição da floresta.

Apesar dos dados disponíveis apontando o problema, Bolsonaro nega a situação. «Essa história de que a Amazônia arde em fogo é uma mentira», disse o presidente em discurso durante encontro com outros mandatários da América do Sul para discutir a preservação do meio ambiente.

O aumento do fogo na Amazônia sob Bolsonaro gerou grande repercussão internacional no ano passado.

A prática de minimizar ou ignorar dados ambientais também é seguida por outros membros do governo.

Recentemente, Hamilton Mourão, vice-presidente e chefe do Conselho da Amazônia, e Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, compartilharam um vídeo que afirmava que a Amazônia não estava queimando. Posteriormente, o vídeo, que contava, em seu final, com o logo de uma associação pecuária do Pará, foi tirado do ar pelo Twitter por violar direitos autorais.

Em seu postagem, Mourão afirmou: «Essa é a verdade. Nós cuidamos!».

Bolsonaro e outros membros do seu governo também constantemente buscar dissociar a ideia de queimadas e desmatamento, apesar do corpo de evidências que mostra que as duas ações intimamente ligadas.

PANTANAL

O fogo também cresce sem controle no Pantanal. Com uma grave situação de seca, o bioma teve o primeiro semestre com o maior número de queimadas já registrado pelo Inpe para a região e os meses seguintes não apresentaram sinais de melhora.

Mês após mês, o número de focos de calor no bioma supera com folga o de anos anteriores, segundo dados do Inpe.

As queimadas no Pantanal já destruíram o maior refúgio do mundo de araras-azuis e ameaçam projeto de conservação de onças a partir do turismo.

Mesmo com situação crítica do fogo no Brasil, o governo Bolsonaro cortou os orçamentos do Ibama e do ICMBio em 2021. A medida, segundo especialistas, pode comprometer a fiscalização de crimes ambientais.